28/04/2013

A violência do Estado


QUEM É QUEM NESSA HISTÓRIA?
 

O primeiro sentimento quando nos deparamos com fatos como o ocorrido esta semana em São Bernardo do Campo, onde uma pessoa de bem foi queimada viva em seu próprio ambiente de trabalho por ter apenas trinta reais na conta bancária, é dos mais primitivos possíveis. 
Por alguns instantes, não sei precisar por quanto tempo exatamente, vem um desejo insaciável de pegar com as próprias mãos a pessoa ou as pessoas que cometeram a desumanidade e aplicar nelas duas ou mais vezes a mesma dor que elas provocaram na vítima incauta. Bem devagarinho, olhando no fundo dos olhos delas, de preferência em praça pública, diante de milhares de pessoas gritando vai-vai, mata-mata, para que elas sintam na pele toda nossa repulsa pela sua existência equivocada. Esquartejá-las em seguida dando os restos de seus corpos ensanguentados aos cachorros famintos.
O tamanho do ódio que explode dentro de nós é tão grande ou maior, quanto o mal que essas pessoas representam por estarem, simplesmente, vivas.
É natural esse sentimento, afinal, somos humanos e ninguém é de ferro, pô! Há reações eletro-químicas em nossos corpos que disparam energias muito além do nosso controle e quanto maior for a crueldade constatada, maiores serão essas reações. Elas são impulsivas. 
É sinal de saúde, eu acho, desde que esse sentimento não se estenda para além do efeito da adrenalina. Depois disso penso tratar-se da mesma anomalia que o delinquente carrega dentro de si vinte e quatro horas por dia.
O duro é que não se trata de um episódio isolado esse de São Bernardo, um do tipo que aconteceria a cada cem anos. Convivemos com a violência e não é de hoje. Aliás, ela está cada vez maior, ramificada, estruturada e cada vez mais próxima da gente.
Diariamente nos deparamos com notícias da mesma natureza e a cada crime os requintes de brutalidade aplicados pelos marginais se intensificam. E o pior, sabemos o quanto essa barbárie pode nos alcançar, o risco parece eminente.
Claro que a violência não está somente em São Paulo, na grande São Paulo ou no Brasil, o planeta está saturado, mas este é o país onde vivemos e é nele onde criamos nossos filhos e depositamos nossas esperanças e bem sabemos como são as coisas por aqui. Passa o tempo e nada muda pra melhor é só blá-blá-blá de fulano A, B ou C.
Para não embarcar no mesmo ódio, penso que devemos dizer um não bem grande à pena de morte para casos de extrema crueldade. Vale mesmo a estes, uma bela pena-de-vida-reclusa ao torturador. Prisão perpétua aos caras do mal, lá não sei aonde, bem longe de nós. Sem direitos humanos, esses de apologia que não se alinham à perspectiva da realidade da perversidade. 
Seriam vistos pela sociedade como aberrações, independente da idade que tenham, nítidas formas de vida mal explicadas, experiências genéticas mal sucedidas, ou coisa assim. Ficariam disponíveis para experimentos científicos substituindo os ratos de laboratórios.  
Bom seria se perdessem definitivamente a identidade civil. Seus nomes deixariam de constar dos registros de cartórios, apagando também qualquer vestígio de que um dia pudessem ter existido como cidadãos comuns. 
Nas prisões federais, locais de controle absoluto, eles seriam identificados através de códigos de barras, tatuados em vermelho cor de sangue pela testa e pelas costas ou em micro chips implantados em suas carnes na região lombar do corpo. Seriam submetidos a criteriosos e objetivos trabalhos forçados na produção de bens de consumo para a sociedade, assim custeando a operação carcerária e laboratorial para as suas existências confinadas. 
Nem mesmo direito a visitas eles teriam, seja lá de quem fosse, já que, se penalizados, como querem alguns, de forma capital, por injeções letais, por cadeiras elétricas, forca, guilhotina ou câmara de gás, seus parentes e amigos jamais os veriam novamente. Essa seria a lógica, tratá-los como meras aberrações desprovidas de qualquer tipo de rastro humano. Assim como  vermes e bactérias.
Parece duro demais, não é mesmo? Eu sei, também achei cruel o que escrevi. A adrenalina segue a mil por hora nas minhas veias. Repito, se ao menos estivéssemos diante de um fato isolado, um daqueles que acontecessem a cada cem ou duzentos anos, daria outra dimensão ao fato. 
Mais duro ainda é que nem bem assimilamos cada ocorrência, outras tantas chegam na mesma velocidade, fazendo-nos esquecer das anteriores muito rapidamente, numa sucessão angústias. 
A violência impera hoje em dia no país, acho que muito mais que ontem. Quem nos garante que nas próximas vezes, nossos nomes não estarão estampados nas primeiras páginas dos jornais, com nossas fotos grampeadas do Facebook, escancarando os sites e programas de TV sensacionalistas. Só de pensar dá calafrio.
Li uma frase de efeito outro dia dizendo que um escravo que tem dois donos não é um escravo, mas sim, um homem livre. O contexto descrevia o “duplo comando" nas relações humanas, nas empresas e na sociedade como um todo, argumentando que nessa condição, a operação fica fragilizada e o homem acaba não atendendo nem a grego e nem troiano comprometendo a produção e possibilitando a sua fuga.
Sim e não. Penso que, quando um escravo passa a ter dois donos, ele não vive por muito tempo, fatalmente será vítima de um desses donos ou de ambos ao mesmo tempo em consequência da luta pelo seu controle. 
É mais ou menos como vejo a situação do Brasil especificamente, muito intenso na criminalidade, mesmo considerando que há violência no mundo todo. Estamos nós, pobres mortais, entre a bandidagem das ruas e a bandidagem dos palácios, sem ter para onde correr. Se ficamos o bicho nos pega nos faróis, nos cruzamentos ou nos consultórios dentários, se corrermos o bicho nos come vivos dentro das linhas da lei. Uma nação que tem duplo comando tem o povo  vivendo sob o caos. É um absoluto estado de desorganização instituída. A ordem e o progresso vão para o espaço, perto das estrelas.
Duas coisas precisamos fazer urgentemente para mudarmos essa condição: darmos um não bem grande às drogas, de qualquer natureza, pois elas alimentam o crescimento e a organização da bandidagem e na mesma proporção, um outro não enorme, aos políticos, governantes e afins que costumam se apresentar como revolucionários, pois estes se alimentam dos bandidos produzidos pelo próprio sistema.
Sabe aquela história do gato que corre atrás do rato em volta de uma mesa redonda? Pois é, chega uma hora que a gente não sabe mais quem persegue quem e nem muito menos, quem é quem do gato ou rato, até que um deles avance sobre a gente do nada tentando nos devorar.
Portanto, o ódio tem de ficar de lado. Vale mesmo estarmos atentos, lúcidos e dispostos a mudar tudo o que for preciso, com coragem e sem idolatrias, vale para pequenas ações do cotidiano. Devolva o troco quando, por engano, lhe derem a mais, por exemplo e não aceite do estado, esmolas disfarçadas de direitos adquiridos. (de nenhum dos dois estados).
Acho que dessa forma teremos alguma chance.

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