21/06/2020

Tinea Pedis - O dia em que virei número.

Acordei segunda-feira passada com uma coceira intensa por entre os dedos do pé esquerdo. Assonado instintivamente roçava sem parar o pé direito por entre os dedos do esquerdo buscando conforto. Meio complicado fazer isso, mas é o que tinha de momento. Os alívios deliciosos duravam segundos pois logo voltavam as coceiras e cada vez mais fortes ainda. 
Raio de coceira!

Por dois dias essa praga o tempo todo coçava, trabalhando até fazia pose de bailarino russo passando um sapato sobre o outro. Procurei, então, ajuda no posto de saúde.

Ao perceber minha irritação o médico franziu as sobrancelhas sacando o estetoscópio dos ombros colocando-os nos ouvidos orientando para me deitar numa maca com a tinta beje bem desgastada que ficava ao lado. O papel que servia de lençol nela fez muito barulho. Parecia que eu ia rasga-lo todo. Quis tirar o sapato mas ele disse que não precisava.

Silêncio no consultório e por isso passei a ouvir minha respiração agora um pouco ofegante. Olhava atentamente para o médico que me examinava e eu achando estranho o fato dele não se dirigir ao meu pé esquerdo que a essa altura inflamava de tanta coceira. Se eu coçava doía, se não, coçava e ardia e ele nem aí. Praga de coceira! Praga de médico!

Ele sai da sala sem dizer nada e volta minutos depois acompanhado de duas outras pessoas. Um me pareceu ser médico também, mais velho que o primeiro, de cavanhaque, bigode e meio calvo exibindo experiência. Ela com cara de enfermeira chefe, sisuda, nada simpática dando ares de ,uita entendida. Todos usavam máscaras. O primeiro médico sem se dar conta pôs uma das mãos sobre meu pé esquerdo. Mesmo calçado senti um certo alívio, mas não passou disso, foi uma atitude inadvertida dele.

O silêncio dominava o ambiente. Eles se comunicavam por olhares rápidos e sobrancelhas que se arqueavam, umas mais outras menos. Saíram da sala um atrás do outro como numa fila indiana.

Em seguida outros dois enfermeiros abriram a porta manobrando uma maca flexível toda em aço inoxidável, bonita de ser ver, ambos protegidos com macacões e capuzes hospitalares. Notei seus rostos através do visor translúcido, um tipo oriental e o outro afro. Fizeram a transferência do meu corpo com a agilidade de açougueiros quando arqueiam peças gordas de carne nos ganchos dos frigoríficos. Da maca com lençol de papel para a flexível de aço inox em menos de um segundo.

Na saída do Posto me dei conta que estava sendo transferido para um hospital numa ambulância do SUS. A situação exigia maior atenção das autoridades de saúde. Alguém com uma prancheta nas mãos escrevia alguma coisa. Minha esposa e filhos me acenaram como se estivessem se despedindo, talvez para sempre. Não foi, nos encontramos dias depois recuperado do vírus.

Maldita coceira. Infecção por fungo. Frieira dos infernos. 

Uma pomadinha que comprei na farmácia logo quando saí do hospital resolveu o problema.